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meus oito anos

     Tenho impressão que me lembro de quase tudo que aconteceu na minha vida dos meus 08 anos de idade pra cá e com muita certeza não me lembro de tanto, mas guardo algumas memórias pontuais do que vivi antes dessa idade, não sei se por que com 08 anos eu tive minha primeira mudança de cidade, de escola, de amigos e isso me fez "acordar pra vida", ou se realmente foi a idade, não sei se na verdade esse marco tem a ver com o poema de Casimiro de Abreu, lembro como se fosse ontem de quase tudo que aconteceu na minha vida depois dos 08, inclusive eu recitando tal poema para os meus pais (ainda lembro dos rostos deles achando graça e do som do riso do meu pai):

"Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!"

    E tenho a impressão também que com 08 anos eu achava que sabia de tudo (eu sempre achei que soubesse de tudo). Loreta está prestes a iniciar seu 8º ano de vida e nós duas já vivemos TANTA COISA juntas que eu nem consigo descrever e eu não sei se é coisa de mãe, mas eu tenho uma estranha obsessão em apresentar o mundo pra ela em todas as suas faces (das melhores até as piores e mais cruéis), toda hora e sem descanso, há 08 anos e contando eu preparo Loreta pra vida, pra uma vida que eu posso não existir principalmente. 

Não é pra ninguém ficar triste, mas eu sendo mãe me peguei pensando (desde que ela nasceu) que eu poderia deixar de existir por algum infortúnio do destino, sem aviso prévio e desde que esse pensamento me visitou me sinto na obrigação constante e permanente de pavimentar uma vida linda, segura, confortável e colorida pra ela enquanto eu existir e tenho a impressão também que meu pai fez exatamente isso, pensando do mesmo jeito que eu, talvez.

E Loreta, na aurora da sua vida, da sua infância querida me faz sentir uma sensação enorme de bem-estar, de missão sendo cumprida e contando sim, mas ela já é a Loreta que vai ser com 18, 28 ou 48 anos, eu não tenho dúvidas que a menina que eu cuido, materno, educo às vezes grito ou brigo sem a menor necessidade e depois me arrependo é uma menina essencialmente boa, amiga, generosa, companheira, comunicativa, alegre e feliz, que tem também preocupações, questões que aperreiam a cabecinha dela, mas que coleciona nos 'divertidamente' memórias de base que mesmo que como eu que não me lembro de quase nada antes dos 08 serão base de sustentação de uma personalidade incrível.

Não ter filhos é uma escolha muito boa, mas ser mãe te faz professora da vida pra alguém e te dá a obrigação ou oportunidade de explicar o mundo pra uma pessoa que você fez, explicar o mundo é falar de gentileza, de higiene básica, limpeza coletiva, de empatia, de desigualdades e injustiças, é explicar coisa miúda e explicar coisa gigante, na mesma proporção de importância.

E mesmo que em alguns anos ela não lembre de nada até aqui, eu lembro de tudo que vivemos nesses longos e ao mesmo tempo rápidos 08 anos de vida e todas essas memórias guardo comigo junto com as memórias de toda minha vida desde que completei 08 anos.

Há 08 anos Loreta adormece no meu braço direito e quando chegamos nesse momento, apesar de não ser tão confortável dormir com alguém assim, uma paz enorme invade meu peito e tenho a certeza que Deus existe e que a vida no outro dia tem sentido pra que no final dele ela possa repousar nos meus braços de novo e de novo até o dia em que ela não queira mais...


 

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