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o corona, a meditação, o osso de galinha, a menina da tv

Estamos sendo massacrados por uma doença que atinge nossas vias respiratórias, não é uma "gripezinha" como ousam dizer por aí. Dizem que a probabilidade de causar maiores danos está restrito a grupo de riscos, como idade e comorbidades associadas, mas a missão de todas nós no momento é lutar para diminuir ao máximo o potencial de transmissão do vírus com uma medida básica de prevenção: ficar em casa.

Qualquer coisa fora do padrão de normalidade da nossa saúde, já incomoda bastante, imagina então uma doença respiratória o quanto nos debilita. Deve ser muito desesperador. Respirar é um ato involuntário, a gente respira que nem sente. Tento meditar às vezes e em todas as minhas tentativas eu lembro de duas coisas que ficaram marcadas na minha memória.

A primeira é de um paciente. Conheçam a história: em um dia qualquer ele tava almoçando e teve um engasgo com osso de galinha, pela maneira que relatou não foi um engasgo que ele considerou importante, passou, algum tempo depois, acho que meses, ele começou a apresentar sintomas de febre e dor no peito, se relatou mais eu não lembro, fizeram exames de raio-x e outros exames e não conseguiram identificar o problema, até fazer uma tomografia e conseguirem visualizar um corpo estranho em um dos pulmões, sim, um pedaço de osso de galinha, pulmão com infecção grave.


Na ocasião, ele contou que nunca foi fumante, era uma pessoa do interior, enfim, ele perdeu o pulmão que o osso ficou alojado, fiquei muito sentida, triste, comovida com o caso.

A segunda coisa que sempre me vem na cabeça nas minhas tentativas de meditação é uma menina na TV relatando sobre a situação de saúde dela, ela tinha graves problemas respiratórios, eu realmente não recordo detalhes, mas ela tinha se recuperado e lembro dela dizendo sobre como era bom sentir o ar entrando nos pulmões, eu achei extremamente emocionante.

Então, todas, TODAS as vezes que sento no chão e me ponho a meditar, respiro fundo e lentamente e resgato essas duas pessoas na minha memória, sinto o ar entrando nos meus dois pulmões e é uma sensação verdadeiramente boa e me sinto feliz em poder ter pulmões e respirar. E no meio da pandemia de coronavírus, lembro dessas duas pessoas e mal posso imaginar o sofrimento de todas as outras acometidas pela doença, com todos os sintomas respiratórios graves que ela pode causar e a agonia e a dor.

Aos que podem ficar em casa e tem seus dois pulmões íntegros, recomendo que respirem sentindo o ar enchendo o peito, em tempos de coronavírus, encher o pulmão de ar é privilégio.


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