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Mostrando postagens de 2021

a gente esquece que morre

A gente esquece que morre, até alguém morrer perto da gente. A morte sempre manda recados, independente de como ela aconteça. A gente então é avisado, ou até aprende, aí a vida segue, a gente vive e voltamos a ser imorríveis porque a gente esquece novamente que podemos partir a qualquer momento. Até morrer alguém de novo, alguém que te toque, que você sinta o impacto. É assim pelo menos pra mim. A compreensão da finitude da vida é uma variável importante pra quem sabe do valor de viver. A vida é preciosa. Nós precisamos viver a vida que cada um de nós temos nas mãos, algumas condições de vida não são fáceis, elas são desumanas, degradantes, e ainda assim é preciso vivê-la. Estar vivo é uma oportunidade, de aprender, viver, sentir, amar, perdoar, de enfrentar as dificuldades que a vida carrega ou de ajudar a facilitar as dificuldades daqueles que estão por perto através da consciência que somos um grande coletivo. É preciso da morte pra lembrar que a gente morre, é preciso lembrar que a

TRAJETÓRIA DE LUTAS, SACRIFÍCIOS E VITÓRIAS

Cresci ouvindo as histórias de vida do meu pai e da minha mãe, entendendo que onde estávamos, era muito melhor de onde eles estiveram. Minha mãe conta que junto a nove irmãos esperava ansiosa meu avô Zé Guedes chegar da pesca pra comer, meu pai mais de uma vez me dizia que era servido por minha vovó Jovem com um dedo de manteiga no prato para comer com o pão e cresci sendo testemunha e sendo uma discreta colaboradora prática das lutas dos meus pais e da minha mãe pela nossa sobrevivência.  Eu vi bem de perto tudo que aconteceu nas nossas vidas através do esforço do meu pai que tinha como profissão ser segurança privado/vigilante e da minha mãe que antes de trabalhar com várias coisas, era a nossa principal cuidadora diária. Vi meu pai após pedir corajosamente demissão do Grupo João Santos por dizer não aguentar situações de humilhação - mesmo com dois filhos pequenos - vender nosso pequeno apartamento de cohab (ainda lembro da plaquinha de “vende-se” com o valor, R$ 3.000,00, o ano era

a vida finda

Vivo hoje o 7° dia da partida do meu pai dessa vida, perdi a pessoa que mais amava nesse mundo (até minha filha chegar). Foi como se tivessem arrancado um pedaço do meu corpo, dói tanto, morrer dói nos outros. Não importa as circunstâncias, o tempo, a forma, ninguém quer perder quem ama. E ainda que ele vivesse dizendo "eu já posso morrer" se referindo a nossa condição material: ele aposentado, deixaria a pensão pra minha mãe, eu enfermeira concursada, meu irmão engenheiro, uma neta que ele sempre me pediu, ele não podia morrer. Eu não queria perdê-lo por nada nesse mundo.  Na segunda passada, 16 de agosto de 2021 perto das 19h recebo a ligação da minha mãe aos prantos, "beta, acho que teu pai tá morrendo" e eu morri um pouquinho ali também, nunca uma viagem pra Itamaracá foi tão longa, fiz promessas pra Deus e pra Nossa Senhora da Conceição. Mas não tinha mais promessa que desse jeito, meu pai tinha morrido. Partiu de  forma relativamente breve, com alguma angústia

bastidores da pandemia

O que você perdeu nessa pandemia? Seu pai, sua tia preferida? Sua namorada? E os momentos? Quais momentos importantes da sua vida a pandemia impediu de acontecer? Já vi algumas pessoas falando "minha filha disse que essa é a idade do primeiro beijo na escola", só que ela está em casa. Outro amigo publicou, "ela ainda não frequentou a escola e já está no segundo ano do ensino médio".  Minha filha de 04 anos quase todo dia me lembra que não conhece um zoológico de verdade. Acho que a maioria de nós perdeu um momento importante e significativo nas nossas vidas que foram impedidos de acontecer até então, devido ao isolamento social. Assim como esses exemplos, fiquei pensando em quem ingressou na universidade ainda ano passado, eles não sabem ainda a emoção de entrar na sala de aula e de ter a recepção de calouros.  Ou aqueles e aquelas que sonham em uma festança de casamento ou de aniversário dos filhos/as, aquelas festas que a gente passa um ano planejando, organizando

ônibus na pandemia

Desde o início da pandemia em 2020, parei de usaro transporte público, o ônibus era quem me levava ao trabalho todos os dias. Mas devido a questão de segurança, comecei a usar o carro, que preferia não usar, por várias questões.  Só que vez ou outra, preciso usar ônibus e eu sinto tanta coisa, é como eu costumo dizer, se quiser conhecer o povo, tem que andar de ônibus (ou metrô). É lá que nosso povo se encontra e a vida acontece, já pensei até em escrever um livro de crônicas com histórias ouvidas nos ônibus, se tem contato mais próximo, desconheço.  Só que estamos na pandemia e esse é o problema, o contato que os transportes públicos promove. Tá errado. Nessa semana, soube que um irmão de um colega de trabalho morreu com covid, foi três dias entre internar e evoluir pra morte, ele era motorista de ônibus, e foi quando me perguntei "quantos motoristas de ônibus morreram nessa pandemia?" Eu não sei. Mas o fato é que se eu que sou enfermeira estou exposta na enfermaria de covid

mulheres de contraponto

Nós, feministas emancipacionistas, construtoras do feminismo popular nas nossas lutas e tarefas diárias, neste momento de 3ª Conferência sobre a Emancipação da Mulher do PCdoB, nos diferenciamos das demais companheiras feministas pela compreensão que acumulamos sobre o processo determinante de construção do machismo estruturado na nossa sociedade, através da questão econômica e social, entendendo também os demais condicionantes de vulnerabilidades. Entendemos que a origem da opressão de gênero está no surgimento do capitalismo e com ele da propriedade privada, os quais consolidaram o papel da família e da mulher como protetores e mantenedores dessa propriedade, esta é a base estrutural do machismo nas relações sociais. E a partir dela perpetuam-se as concepções por exemplo, que a mulher é parte da propriedade do homem, e se é vista como tal é "permitido" sermos violadas, violentadas e mortas por nossos companheiros e também nasce a concepção que o trabalho da mulher é de cuid

uma nação abandonada: sem vacina, sem emprego, sem auxílio

       O que mobiliza pessoas a construírem as lutas coletivas diariamente? Quando eu era presidente do DCE da UPE, conheci a história de uma menina da minha faculdade de enfermagem, estava ocupando a sua tão sonhada vaga na universidade pública, até que as condições não permitiram que ela continuasse, pois era do interior, não tinha quem a apoiasse por aqui, estava na casa de terceiros que em pouco tempo as portas foram fechadas. Ela retornou pra sua cidade, pra trabalhar e tentar outra vez a tão sonhada vaga, quem sabe. Saber disso foi muito doloroso, era por pessoas como ela que fazíamos a luta pela assistência estudantil, pelo direito à condições básicas de estudantes permanecerem na universidade através de passe livre, casa do estudante e restaurante universitário.     Hoje, enfermeira da atenção básica testemunho o grande sofrimento coletivo que uma parcela da população enfrenta, as pessoas estão sem renda e trabalho, sem assistência social, estão enlouquecendo, estão desesperada

a casa de vovó

 Eu acho a memória a coisa mais preciosa que a gente tem, depois da vida em si, a memória do que já foi vivido, sentido, doído vale muito. Eu sempre tive uma boa memória, tão boa que às vezes acho que passo até vergonha, como encontrar uma pessoa 15 anos após ter visto pela última vez e cumprimentar como se fosse ontem, acho que já assustei algumas pessoas. Às vezes do nada me vem memória de imagens, sensações, momentos, como se pudesse ver passando na frente dos meus olhos. É bom, às vezes bate uma melancolia, às vezes saudade, mas é a vida vivida. É bom lembrar por exemplo da casa da minha avó materna em Itamaracá, de todos os detalhes, era uma casa simples, metade de tijolos, metade de "taipa", com telhas, tinham gaiolas espalhadas pelo teto, não lembro muito bem de tudo, mas guardo com carinho memórias da cadeira de balanço da sala, do rádio que ficava do lado esquerdo do corredor que meu avô anotava o resultado do jogo do bicho, lembro da voz que anunciava o resultado co

à manauara Gabi Cativo

 É até difícil organizar as palavras pra descrever tanta coisa que venho sentindo. É que os dias tem se tornado cada dia mais duros e pesados, como no início de abril do ano passado, nenhum de nós imaginávamos que poderíamos estar vivendo uma situação como essa, como disse uma colega (que perdeu a filha recentemente), parece um pesadelo, ou talvez como o inferno quem sabe. Sempre fui uma pessoa extremamente fragilizada emocionalmente, sinto muito por tudo e qualquer coisa, e o ofício de enfermeira em plena pandemia me enlouquece e me fortalece na mesma medida. Eu gosto de me comunicar com as pessoas não por obrigação, mas por livre e espontânea vontade, acontece que na maioria das vezes na visita aos pacientes, me faltam palavras, eu realmente não sei o que dizer ao senhor de 90 anos que no dia 31  de dezembro está sozinho num leito de hospital e que me diz que está sofrendo, ou ao outro senhor do leito vizinho que acabou de perder a esposa, ou a senhora que está com o filho entubado n

referência militante

Essa conversa é somente pra quem como eu, se entende militante, queria saber se assim como eu vocês também se cansam de ser assim, claro, existe militância sobre tudo, militantes do meio-ambiente, do feminismo, do SUS, ou os de igrejas e de movimentos anti-vacina, ou os veganos e veganas, eu pelo menos acho que tudo isso é uma militância porque você defende algo não só pra você, mas pra toda sociedade, então vai pra disputa de ideias, de opiniões pra que a gente possa mudar o mundo naquilo que a gente acredita. E fazer isso cansa, consome energia, desgasta. Conheci muita gente no movimento estudantil que por não saber equilibrar as doses de envolvimento com a militância e as demandas da vida pessoal e profissional, optaram por abrir mão da vida política, porque de fato ela pode ser pesada se você não sabe conviver com ela. No movimento estudantil, como costumo dizer, pude desvendar o mundo através dos óculos da militância, é como se a gente fosse limpando ele e conforme estuda, aprende